As famílias tentam educar, as escolas e universidade tentam ensinar, mas o fato é que tem coisas na vida que não têm como serem absorvidas sem a vivência.
Saber perder, por exemplo, é algo que não se encontra em nenhuma cartilha. Ninguém chega e te oferece um curso de como ser um bom perdedor em três módulos, básico, intermediário e avançado. Não é que a vida seja como um jogo, no qual depois do start inicial é cada um por si e deus contra todos. Mas há algumas semelhanças, não?
Quando falo em perdas não me refiro a algo em específico, mas num âmbito geral. Ainda crianças, devido aos estágios do desenvolvimento, perdemos o peito materno - ah, o peito da mamãe! Com as confusões e os enigmas da adolescência ganhamos uma certa malandragem, que aos poucos vai deixando os atributos angelicais e a inocência para trás. Depois das primeiras transas o lance já não é mais só beijar na boca. As responsabilidades do adulto jovem fazem dar saudades dos tempos em que os compromissos eram poucos ou que se podia esquivar deles. Enfim, cada momento tem seu êxtase e, inevitavelmente, algumas coisas vão se perdendo no caminho.
Bem, voltando à questão de saber perder. A cada dia a gente tem um decréscimo de vida. É duro admitir isso? É, até pode ser. Mas a cada tic-tac do relógio nosso tempo vai expirando tal como uma licença de antivírus de computador. Com um detalhe, as licenças podem ser renovadas, já a vida tem de ser vivida até o último suspiro. E depois disso? Cremação, céu, inferno, purgatório, reencarnação e tudo mais não passa de especulação. Afinal, não se tem registro de alguém que voltou para dizer o que vem depois que o médico atesta o óbito.
Acontece que a maior parte da sociedade insiste em imprimir nas pessoas que elas devem ser bonitas, saudáveis (ou nem tanto, desde que tenham silicone e bunda empinada e barriga de tanquinho), vencedoras, cheias de sucesso, realizações, prosperidade, etc e tal. Isso não remete às semelhanças da vida com um jogo? Ah, deixa pra lá esse lance de vida, jogo, jogo da vida. Esquece.
Então, às vezes o melhor caminho é andar na contramão do que é imposto como certo. Ao conjecturar que na vida tudo é um mar de rosas você pode estar à beira do suicídio se alguma pétala for levada pelo vento. Porque não admitir nossa condição humana, imperfeita? Não que isso seja explicação para os fracassos ou discurso de derrotado. Ao contrário, é importante tomar ciência de que as coisas podem não sair conforme planejamos, que algumas coisas não dependem apenas da nossa volição, que exatidão mesmo só nas ciências exatas. Probabilidades e possibilidades, aproximações. É isso que temos. E aprender a trabalhar com isso é muito bacana.
Às vezes vamos perder uma amizade, relacionamentos afetivos serão desfeitos, haverá morte de pessoas queridas e tantas outras coisas que fazem parte dos mistérios da vida. Cada uma destas situações envolve perdas. E para perdas há de se fazer um processo de luto bem elaborado para não cair em problemas ainda mais sérios que a própria perda.
Muitas pessoas se desestabilizam, se desestruturam quando passam por perdas, por menores que possam parecer seus efeitos. Eu até me dou bem com as intempéries e armadilhas da vida. E quando estou parecendo um bobo alegre é porque eu não posso deixar de vibrar com cada detalhe desta dádiva que é estar vivo.
São apenas características. Não existe uma maneira certa e outra errada de viver, tampouco algo bom ou ruim. São diferentes formas que se expressam as existencialidades. Como diria Will Goya "sem contexto, tudo é nada".
* Inspirado pela crônica de David Coimbra, O que mais sei fazer, publicada no jornal Zero Hora de 29/05/2012.
"O que quero dizer é que a rejeição e o fracasso não me roubam o bom humor. Estou acostumado com eles. Mas vejo que a maioria das pessoas não está. A maioria das pessoas é vencedora. Elas têm excelente opinião sobre si mesmas e, se sofrem um revés, se abalam, se entristecem."
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