Originalidade?

Minha história se fez e se refaz com resquícios de tudo que encontra minhas circunstâncias. O que se apresenta para minha representação pode (ou não), em maior ou menor relevância e intensidade, ser incorporado à forma com que entendo o mundo.
As tintas com as quais pinto as telas da minha existência são variadas. Algumas cores já foram utilizadas por muitos outros artistas e integram minhas obras por serem ainda vivas, intensas; outras matizes, por sua vez, são inéditas, mesclas de algumas cores que ninguém antes havia ousado em compor.
Se alguém sentir-se lesado por algum escrito, favor me comunicar por e-mail que tentaremos resolver isso.
Divirta-se ou se entristeça.
Boa viagem!

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Ciúmes*

Há meses atrás, em palestra de Filosofia Clínica aberta ao público o tema central foi ciúmes. Para iniciar os trabalhos, uma pergunta inicial foi lançada pelo Professor Lúcio Packter:
- Vocês sentem ciúmes?
Apressado, um colega presente acenou com a mão estendida para cima:
- Ah, eu já senti mais. Acho que aprendi a lidar bem com isso.
Tão logo ele expressou sua opinião, uma colega estendeu o braço para cima, o indicador apontando para o teto:
- Eu sinto! O que é meu eu quero só para mim. Eu sinto uma coisa estranha, uma reação em mim em relação ao ciúme.
Aqui já podemos ir dando as coordenadas. Quem está certo? Quem sente ciúmes ou quem não sente? Não é uma questão de estar certo ou errado, de ser bom ou ruim. Sentir ou não ciúmes indica apenas traços da forma de ser da pessoa. Portanto, a resposta para as questões anteriores é nenhuma das opções.

Sentir ciúmes é uma das características da nossa época. Herdamos os ensinamentos da posse, da propriedade, do ter, mas esqueceram de ensinar-nos o amor genuíno, aquele que parte da afinidade. Isso costuma trazer consigo sentimentos de desconfiança, de insegurança, de dúvidas, de controle. Na maioria dos casos, sentir ciúmes não costuma ser agradável, aprazível. Algumas relações, porém, são calcadas nos ciúmes. Ou seja, o ciúme de X para com a Y pode funcionar como um vínculo muito forte, dando a impressão, para Y, de estar sendo cuidada, acarinhada, protegida por X. 

Às vezes, na relação minha com determinada pessoa falta um pouco de mim para ela; algumas coisas não são transmitidas de mim para ela em forma de expressividade, a ponto de tais coisas ficarem somente em mim. Ocorre que a pessoa talvez encontre em outra pessoa, em outra coisa, em outra situação isso que não vai de mim para ela, isso que de mim não flui para ela. Muitas dessas ocasiões podem desencadear crises de ciúmes.

Existem fenômenos deslocados em se tratando desta temática. Temos exemplos de pessoas que não sentem ciúmes do marido ou da esposa, mas sentem do(a) amante. Descontextualizado isso pode gerar polêmica. Mas o que estamos tratando aqui é de ciúmes. Então que seguremos nosso julgamento ético a respeito disso. Enfim, são tantas as configurações quanto as formas que possamos imaginar.

Muitas vezes as crises de ciúmes não tem nada a ver com a gente, não é nada pessoal. São só elementos que estão em áreas de trânsito em nossa existência e se esvairão de mansinho. 
Então em várias ocasiões podemos evitar confrontos, discussões, mal entendidos, incômodos. Se analisarmos as circunstâncias e identificarmos o que está acontecendo, logo estaremos vivenciando de outra forma esse sentimento em nossos relacionamentos, em nossas vidas.

* Baseado nas minhas anotações feitas durante a palestra citada no início do texto.

domingo, 23 de setembro de 2012

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Eu não quero ser adulto, porra!

Algumas de minhas manias são de criança. Alguns de meus comportamentos são de criança. 
Minhas responsabilidades tentam me jogar para esse universo adulto, cheio de prazos para cumprir, horários para tudo, máscaras para usar, papéis para representar.
Mas, ainda assim, meu coração é de criança. Eu deito na grama só para olhar o céu, ando de pés descalços, tomo banho de chuva, ando de balanço, sento no chão, faço refeições andando pra lá e pra cá, rio de coisas sem graça, choro por motivos mínimos, faço birra, sento no colo da minha mãe, beijo meu cachorro, falo de boca cheia, faço drama, choro e dou risada ao mesmo tempo, canto gritando no banho, saio do banheiro pelado pelo corredor, deixo tudo bagunçado no meu quarto, enfim, amo as coisas simples por um único motivo: eu amo estar vivo! Isso não quer dizer que eu seja uma pessoa extremamente feliz, tampouco um pessimista ao extremo. Eu não sou bipolar; eu sou polipolar. Tenho uma capacidade imensa de passar de um bobo alegre a um ser frio e calculista. 
Eu sou mesmo uma criança. A correria do mundo dos homens não faz muito sentido para mim. Eu não vou viver mais de 100 anos mesmo, então de que me adianta insistir em ser o melhor, em ter sucesso, em ser o primeiro em tudo? Não tenho essa pretensão. O que me esforço é para dar o melhor de mim, ser o melhor que eu posso ser, deixar um pedaço meu em tudo que eu faço. O resto é consequência, uma mescla de sorte, acaso, competência, energias do universo.
Alguns, volta e meia, me dizem que tenho que crescer, que amadurecer. Sim, eu vivo em função disso. Mas eu faço isso do meu jeito. E não há um jeito certo para que as coisas aconteçam. Quando a maré está a favor eu curto a paisagem nos entornos do rio; quando a correnteza me força a remar eu faço isso com empenho. E a vida vai passando assim. E para mim isso é o máximo, porque meu coração de criança se contenta com detalhes. E para vocês, adultos, uma dica da criança aqui (vocês até reproduzem isso em palavras, mas poucos são os que vivenciam): os pequenos detalhes podem fazer grandes diferenças.

Abraço de paz!

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O dito popular está equivocado

Há um dito popular muito utilizado aqui no sul do Brasil, o qual diz que "tem que matar a cobra e mostrar o pau". Ele é mencionado quando alguém quer provar algum feito.
Frequentemente alguém remexe o baú existencial e sai contando algumas histórias e/ou estórias. Quase sempre tem alguém que não acredita no que está sendo tratado. Então o camarada trata de chamar alguém que comprove isso, que diga ter presenciado o fato ou outro indício de que seja mesmo algo real. E então "tá aí, eu mato a cobra e mostro o pau".
Em conversas nostálgicas eu costumo citar meu sonho frustrado de ser jogador de futebol profissional. Quando cito alguns episódios de minha passagem pela capital e pela dupla Gre-Nal, há aaanos atrás, eu utilizo as fotos que tenho guardadas como algo que comprove o que eu estou dizendo. Estou "matando a cobra e mostrando o pau".
Mas me veio uma coisa à cabeça. Mostrar o pau não quer dizer que tenha matado a cobra. Mostrar a cobra morta, sim. É difícil que se ache uma cobra morta para se gabar. Quando se aparece com uma cobra morta, muito provável é que a própria pessoa a tenha matado. Então vou corrigir este dito. Não basta mostrar o pau. Taura mesmo é quem mata a cobra e mostra a cobra morta. 

"Entre nós reviva Atenas,
para assombro dos tiranos.
Sejamos gregos na glória,
e na virtude, romanos"

P.S.: Parabéns gauderiada de todos os pagos e querências pela passagem do 20 de Setembro.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Concordar com tudo é escravidão

Acho que é apropriado para a época. Quem se arriscar a me acompanhar, bem vindo(a). Mas antes de me julgar, por favor, tente me compreender. 
Se acaso surgirem críticas fundamentadas, que agreguem vou considerá-las e refletir a respeito. Se vierem críticas mesquinhas, calcadas em preconceitos e dogmatismos ridículos eu só vou lê-las e nada mais.
Na minha adolescência eu vi Marcelo D2 e toda a banda Planet Hemp serem presos mediante o argumento de que eles faziam apologia às drogas. De fato, eles falavam de maconha nas letras, afinal, segundo uma das letras "uma erva natural não pode te prejudicar". Além disso, as letras eram repletas de críticas à corrupção de policiais (uma música, aliás, chama-se "Porcos Fardados") e políticos e de mais um monte de coisa podre que o sistema alimentava. São elementos que muita gente via, mas poucos eram os que tinham a coragem de apontar e se posicionar a respeito. 
Toquei em um tema delicado, mas não é sobre maconha que eu quero falar. É que na época a que me reporto eu tomei conhecimento de algumas passagens da Constituição Brasileira de 1988, que versam, entre outros fatores, sobre a liberdade de escolha e de expressão. Em caráter elucidativo, cito o Art. 5º e seus incisos IV, VIII e IX:
"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;"
Seguindo os pressupostos da Constituição, cada pessoa tem o direito de escolha. Não só existencialmente, mas legalmente. É lícito e de direito que a pessoa possa optar em torcer para o time de futebol que preferir, em participar de atividades religiosas seja qual for a sua religião, em seguir a orientação sexual de sua escolha, em partilhar de representações de mundo vindas de suas predileções filosóficas, em militar no partido político que melhor satisfazer suas ideologias... E mais! A pessoa tem a liberdade de expressar isso da forma que quiser. Esses são os pilares da democracia. 
Uma ressalva: o regime democrático considera a vontade da maioria, mas nem sempre o que a maioria julga como melhor é, de fato, o melhor (além do fato de nem sempre a maioria ser livre para escolher, devido à coações e falcatruras - conhecidas como o velho jeitinho brasileiro). Outra ressalva: neste mesmo regime os políticos eleitos deveriam representar a vontade dos que o elegeram.
Somos livres para fazer nossas escolhas e para expressá-las. Ao menos em tese e legalmente. Porém, infelizmente, o jogo de xadrex político, calcado em interesses individuais e de determinados grupos em detrimento do coletivo, geralmente coloca em xeque o que está na Constituição.
No papel e no discurso tudo é muito bonito. Os problemas costumam acontecer com o que se faz a partir disso. Em tempos de eleições, como agora, os ânimos acabam se exaltando e o trem quase sempre acaba por descarrilar.
Uma dica: não jogue para o ar amizades e parcerias pelo simples fato de haver discordância em alguns pontos. O fato de alguém discordar de uma ideia sua não implica que ele esteja desconsiderando todo o resto. Da mesma forma, tome cuidado para não desprezar o outro por torcerem para times diferentes, por serem de religiões diferentes, por terem opções sexuais diferentes, por militaram em partidos diferentes. Talvez o que falta para que você seja respeitado é apenas um pouco de respeito para com o outro.
Monólogos são bons no teatro. Fechar-se em um único ponto de vista acaba ceifando possibilidades de crescimento. Dialogar é uma arte e um bom exercício de paciência, de escuta, de humanidade.

Que cada um tenha o discernimento para fazer suas escolhas, arcando com as consequências disso. E que o direito do outro pensar diferente e de expressar livremente suas ideias seja respeitado.

Um salve às cabeças pensantes! Porque concordar com tudo é escravidão.

domingo, 9 de setembro de 2012

Temporal de emoções

Dormi acariciando meu cachorro. 
De madrugada, abracei forte o travesseiro.
Acordei no meio da manhã com o barulho da chuva no telhado. Minha mãe me disse que o tempo feio já havia passado. Fiquei na cama por mais algum tempo, ainda meio sonolento, pensando nos sonhos que me visitaram durante a noite.
Abri a janela. Um vento gelado deu um tapa no meu rosto. Por instantes fiquei olhando a chuva, contemplando as cores cinzas do céu contrastando com os tons coloridos de algumas flores. O cheiro disso tudo também é algo mágico, divino. 
Pensei em tomar um banho de chuva. Desisti. Pensei em um banho quente e demorado. Também abortei a ideia. 
Fui lavar meu rosto. Me olhei no espelho e tive dó dele. Que pecado ele fez para ter que me refletir todo dia? Cara amassada, olheiras bem delineadas, cabelos desarrumados ao extremo e mais alguns detalhes horrorosos.
Fiz xixi sentado. Não estava com pressa. Não estava sendo observado. Não precisava cumprir horário. Não tinha sequer a companhia do meu amigo fiel, meu cachorro. Sim, às vezes eu faço xixi sentado. E como tinha acabado de levantar, fiz sem roupa alguma. "Visão do inferno", você pode estar pensando. Pois que seja visão do que quer que seja.   
Escovei meus dentes. 
Escolhi aquela roupa velha, batida, cheia de furos e marcas do tempo, mas mais confortável que qualquer roupa de grife. Gosto desse estilo mulambento, largado, despretensioso. 
Se perfeição fosse algo que existisse fora dos dicionários, diria que hoje é um dia quase perfeito. Ideal para se resguardar. Fazer uma viagem introspectiva. Ajustar o que ultimamente anda meio desregrado. Por alguns pingos nos is. Conversar comigo mesmo. 
Hoje é um dia para lavar a alma. Talvez até mesmo tenha que exorcizar alguns demônios. Algumas coisas vão ser deixadas para trás. Outras vão ser incorporadas. Acho que atualização é uma palavra para descrever tudo isso. 
Depois de beliscar uma torta fria com refrigerante, refugiei-me para o meu quarto. Alguns livros precisam ser lidos. Maldita mania de começar a ler várias coisas ao mesmo tempo. O acervo da minha mini biblioteca está crescendo e o que eu mais tenho feito é escrever a data de aquisição na folha inicial das obras. As leituras estão com o freio de mão puxado à meia altura.
Meu mundo hoje vai ser entre essas quatro paredes. 
Espero que o dia passe rapidinho. Quando a madrugada chegar e eu for me deitar, quero repetir os mesmos passos: acariciar meu cachorro e abraçar o travesseiro. E vou ficar na torcida para que você venha novamente me fazer companhia em sonhos.



quinta-feira, 6 de setembro de 2012

domingo, 2 de setembro de 2012

Bicho de Sete Cabeças


      Bicho de Sete Cabeças é um longa-metragem brasileiro, lançado em 2001, inspirado no livro Canto dos Malditos, de Austregésilo Carrano Bueno. O livro é baseado na história do autor, hoje ativista da causa antimanicomial, que em 1974, com 17 anos, peregrinou por hospitais psiquiátricos. O filme tenta ser um retrato fidedigno da dura realidade que o mesmo vivenciou.
     Neto é um adolescente de classe média que vive em crise com sua família. Seu pai, autoritário, não consegue estabelecer um diálogo com o filho. Sua mãe, uma espécie de mediadora dos conflitos familiares, até se esforça para que haja um entendimento entre eles. Em vão.
Os fatores psicossociais (os conflitos com os pais, o convívio com o grupo de amigos) influenciam Neto a fumar maconha e ter um comportamento rebelde. Porém, considerando a fase da adolescência, nada que comprometesse sua sanidade, pois, apesar da grande vulnerabilidade ao vício, ele não era dependente químico. Ainda assim, seu pai o internara num hospital psiquiátrico após ter encontrado um cigarro de maconha na jaqueta do menino.
No hospital psiquiátrico os internos eram submetidos a um rigoroso tratamento, que na realidade não visava a reabilitação ou a cura. O intuito era manter uma quantidade ‘x’ de pessoas em internação para continuar recebendo as verbas do hospital. As pessoas internadas recebiam fortes medicamentos que abriam o apetite para que elas comessem e apresentassem um bom aspecto quando do recebimento de visitas.
Quando Neto obtém alta do hospital ele até tenta levar uma vida social. Ele consegue um emprego e se esforça para superar os traumas que a internação causara em sua estrutura. Porém, em determinados situações ele recai, sofre vômitos e rememora episódios que vivenciou e que certamente levará para a vida toda.
Após ele beber em uma festa o jovem se altera, não consegue realizar um ato sexual com uma garota. Neto acaba se revoltando e promove um quebra-quebra no local. Pelo histórico de ser uma pessoa com problemas de internação, novamente volta ao hospital psiquiátrico.
O trama acaba com Neto tentando suicídio numa cela isolada. Ao final do filme, pai e filho encontram-se sentados um ao lado do outro.
Muitos aspectos podem ser destacados e servir como pontos de reflexão. A situação que Neto se encontrava ao início do filme, por exemplo, traduz muito bem o que ocorre na adolescência, ou seja, uma fase de experimentação de novas vivências, identificação com o grupo, além de outros que poderíamos destacar. A postura do pai, de certa forma, é o que desencadeou uma sucessão de problemáticas em Neto.
Sua internação levou em conta apenas o depoimento do pai. Isso remete aos casos em que o diagnóstico é precipitado ou forjado. Em nossa sociedade, o paciente é realmente ouvido e o diagnóstico dá conta do que ele está vivenciando no momento?
Enfim, em se tratando de saúde mental e patologias, me parece que o filme consegue alcançar uma profundidade sobre o assunto. Neto até sofria de um distúrbio de personalidade, mas isso não foi trabalhado de forma que seria mais producente ao caso. A condução do caso pela família, que o rejeitou, poderia ter resolvido o problema se conduzido de maneira diferente. Ao contrário, ele foi rotulado e passou a viver um caos. Pressionado a obedecer/reproduzir um regime que visava, por assim dizer, a produção da loucura, era quase impossível Neto não desencadear problemas de cunho psicológico.

O filme foi postado na íntegra no YouTube em efeito espelho. Ainda assim dá pra assistir legal.
Boas reflexões.