Originalidade?

Minha história se fez e se refaz com resquícios de tudo que encontra minhas circunstâncias. O que se apresenta para minha representação pode (ou não), em maior ou menor relevância e intensidade, ser incorporado à forma com que entendo o mundo.
As tintas com as quais pinto as telas da minha existência são variadas. Algumas cores já foram utilizadas por muitos outros artistas e integram minhas obras por serem ainda vivas, intensas; outras matizes, por sua vez, são inéditas, mesclas de algumas cores que ninguém antes havia ousado em compor.
Se alguém sentir-se lesado por algum escrito, favor me comunicar por e-mail que tentaremos resolver isso.
Divirta-se ou se entristeça.
Boa viagem!

sábado, 20 de junho de 2015

Recortes d´O tempo é um rio que corre - III A embocadura do rio

Última postagem com os recortes que prometi. 
Espero que tenha incitado a reflexão com o que compilei aqui.
Dá pra ter uma ideia geral do que é abordado por Lya Luft no livro. Mas a indicação de leitura da obra ainda está valendo.

* * *

III) A embocadura do rio

"Somos náufrago ou timoneiro
nessas águas que tudo levam:
estrelas, escolhas, 
destroços e abraços."

"Se imaginarmos que o nebuloso mar chamado morte pode não ser o fim de tudo, e que esconder o rosto na dobra do braço não adianta nada, em lugar de deixarmos levar com desespero silencioso podemos ter mais consciência da construção disso que somos. E escrever partes desse roteiro, com decisões, com coragem, com medo e terror, acertos e tantos enganos - tudo faz parte.
[...] Nossa vida mais real é o tablet. Nossa única morte é a do game. Nossas alegrias correm o risco de serem apenas virtuais, o amor virtual, milhares de amigos virtuais, a maioria como bonecos nas prateleiras. Quem quer pensar em destino, decisões, compromissos, até mesmo poder e glórias reais que exigem trabalho, e perdas, e dores?"

"No começo da minha história pessoal, morte pertencia à linguagem dos adultos. Ficavam com ar sério ou triste, mas ninguém explicava nada. Possivelmente, se eu indagasse, minha mãe diria, como de costume que isso não é coisa pra criança. [...] Mas aso poucos fui percebendo que as coisas, os bichos, os momentos acabavam (ainda não imaginava que as pessoas também se incluíssem nesse acontecimento)."

"[...] a realidade não existe: cada um inventa a sua."

"A poderosa, onipotente, indesejável e inevitável senhora Morte, nossa desde sempre enamorada, que não queremos ver, nem ouvir, nem aceitar: ela é que vai ter de nos pegar nos braços. Seremos submetidos, seremos domados, seremos absorvidos.
(Não escrevi destruídos)."

"Se perder os pais é doloroso, se a consciência da súbita orfandade em qualquer momento da vida é difícil, uma criança que se vai, sugada pelo funil do grande enigma, é a dor maior. É o horror, a escuridão."

"Essa ave pousada em nosso ombro, pálpebras baixadas para que seu olhar não amedronte, está dizendo 'brinquem, dancem, riam, enquanto minha hora não chega. Paguem as contas! Transem ou bebam ou chorem, ou simplesmente fiquem encolhidos à minha espera, fazendo de conta que não, que não, com a cabeça, como crianças negando que eu existo.'"

"Em certo momento não caberá a nós decidir: apenas iremos. Com medo, com dor, com indiferença, com alguma tranquilidade, quem sabe curiosidade: o que existe e quem está na outra margem?"

"Quantas vezes, num convívio longo ou breve, nos demos conta de que não era eterno? Quantas vezes na lida diária sentimos que era passageiro? Quantas vezes pensamos que atrás dessa superfície alguma coisa mais espera, imóvel, paciente - concreta e real ainda que apenas névoa? Pouco disponíveis estamos para o inquietante. Mas está lá, o avesso de tudo, como passos no corredor embora não haja ninguém, um tumulto sutil no ângulo da sala indicando que acima das frivolidades paira um segredo sem tamanho, que torna tudo precioso e singular, e terrível.
Transitamos por tudo isso como crianças inconscientes, com uma leviandade invejável e alegre, até que essa realidade nos atinge, nos enfia a faca no peito, e nos derruba com aquele soco de uma mão poderosa na nuca de uma criança que não compreende nada.
Cada um de nós de inventar o seu próprio jeito de sobreviver: para alguns isso será deixar as pálpebras bem fechadas, apertar os olhos com os punhos e andar feito cegos como a gente brincava em criança."

"Importa que eu acredite mais na vida que na morte, mais na presença que na ausência: é o melhor que posso fazer por esses que, sem os perdi, perdi."

"Essa singular companheira nossa, a memória, nos ajuda a suportar despedidas."

"Amadurecer, envelhecer, traz várias coisas boas, mas também significa que mais amigos começaram a morrer."

"A morte pode ser o barco atracando em areias macias, ou o rio desaguando num oceano acolhedor. Como ninguém me prova o contrário, gosto de pensar assim."

"Em lugar de reclamar, podemos dialogar; em vez de nos matar, podemos outra vez tentar a vida e desenrolar a alma; em vez de ressecar podemos animar essa criatura singular que somos, com risos, com gemidos de dor, com sussurros no escuro. 
É preciso enfrentar isso que não controlamos, mas que não precisa nos destruir: a vida inevitavelmente fluindo. Pois nós também somos isso."

"Tempo de refletir: as vezes em que fomos egoístas, grosseiros, fúteis, infiéis. As vezes em que não estivemos presentes.
As vezes em que a gente não estava nem aí.
Mas todas as vezes em que a gente fez o melhor que podia naquele momento.
As vezes em que tivemos pena de nós mesmos, em que deixamos que alguém se afastasse ou nos isolamos de quem nos queria bem; o tempo desperdiçado ignorando uma boa oportunidade, e nos boicotamos - o quase imperdoável pecado, tão comum.
(E, mais uma vez, cada hora em que fizemos o melhor que podíamos.)"

"As águas não interrompem seus curso quando dormimos ou comemos, quando amamos ou nos frustramos, quando executamos projetos ou achamos que nossa força acabou. Não param quando comemos hambúrguer, usamos o computador, tomamos vinho, choramos no escuro, pensamos em nos matar, pagamos dívidas com mais dívidas, traímos ou somos traídos, ou rimos sem motivo porque nos sentimos bem." 


Foto extraída da internet.

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